Está em pauta! Na Esplanada dos Ministérios, principalmente
nos gabinetes que arruinaram a economia brasileira nos últimos anos, já se fala
em algo impensável até recentemente: reduzir fortemente as despesas com o
programa Bolsa Família (BF)! Dependendo
de como venha a concretizar-se, essa decisão é preocupante, pois um país
potencialmente rico como o Brasil não pode negar socorro emergencial aos seus pobres
e miseráveis.
“O Bolsa Família (BF) é um programa federal de transferência
direta de renda que beneficia famílias extremamente pobres (com renda mensal de
até R$ 70 por pessoa) ou pobres (com renda mensal entre R$ 70 e R$ 140 por
pessoa). O valor depositado depende do tamanho da família, da idade dos seus
membros e da sua renda. Há benefícios específicos para famílias com crianças,
jovens, gestantes e nutrizes. A família assume alguns compromissos ao entrar no
BF: as crianças devem ser vacinadas e ter acompanhamento nutricional; as
gestantes precisam fazer o pré-natal; e as crianças e jovens devem frequentar a
escola.” (Site do MDS, Capturado em 10/11/2014). O BF surgiu da unificação dos
programas Bolsa Escola, Bolsa Alimentação e Auxílio Gás, criados em 2001/2002,
no Governo FHC, com base no Cadastro Único das famílias carentes do país.
O sucesso desse tipo de programa social, em seu começo,
costuma – e até pode - ser medido pelo número de famílias cadastradas,
identificadas como pobres ou miseráveis e incluídas na transferência de renda,
já que essa prospecção é difícil. Mas
após sua consolidação – e o BF já tem 13 anos! – o sucesso desse tipo de
programa deve ser medido pelo número de famílias que adquirem a capacidade de
gerar rendas próprias, se tornam autônomas e deixam de receber a transferência
de renda do Governo. No início, a
prioridade é a entrada no programa; após 5 ou 6 anos de funcionamento, o
objetivo passa a ser a saída do programa.
Aquelas “condicionalidades” (os compromissos da família)
sempre foram insuficientes para garantir o sucesso do programa e há muito tempo
deveriam ser ampliadas. Trata-se, porém, de um vício de origem. O programa
nasceu errado, com aquela visão esquerdista típica que enxerga na pessoa
carente um ser frágil, incapaz de crescer e se tornar autônomo. A esquerda se
nutre da manutenção da pobreza... Vai daí...
O programa deveria ter usado metodologias de operacionalização
totalmente diferentes das utilizadas nos Governos de FHC e Lula. A
transferência de renda deveria ser encarada, desde sua implantação, como uma
ação inclusiva no âmbito de uma filosofia mais ampla de desenvolvimento
comunitário. Seria um grande movimento de solidariedade nacional, indispensável
em um país de fortes desigualdades como o Brasil, cujos cidadãos chegavam a um
pacto social em favor dos mais carentes. Os beneficiários receberiam o auxílio e
em contrapartida prestariam serviços às suas comunidades. Em última essência, a
si próprios! Auxiliar na preparação da merenda ou limpeza da escola dos filhos;
plantar árvores nas encostas, margens de rios, ruas das vizinhanças; cultivar
hortas comunitárias nos terrenos baldios... Há uma infinidade de
possibilidades. Nesses serviços, devidamente assistidos e apoiados por agentes
de desenvolvimento comunitário, os beneficiários do BF receberiam orientações
gerais e qualificação profissional específica para desenvolver as tarefas que
lhes coubessem – nunca impostas mas sim escolhidas voluntariamente, em reuniões
da comunidade. Desse modo, apareceriam na posição muito digna de ganhar por
serviços por eles prestados ao bem comum. Não estariam recebendo uma esmola do
Governo, em cujos candidatos devem votar para garantir a continuidade do
benefício. Pois é assim que os contribuintes interpretam o programa. Por outro
lado, treinados nesse processo, os participantes do BF seriam preparados para
obter uma ocupação que futuramente os liberaria do assistencialismo
governamental.
Quando fui Subsecretário Adjunto da Secretaria de Trabalho e
Renda do Estado do Rio de Janeiro, tive logo de início uma reunião com
representantes da Secretaria Estadual de Assistência Social, a qual era
encarregada da versão fluminense original do atual Bolsa Família. Discorri
sobre essa ideia - de que o programa fosse desenvolvido como parte de uma ação
mais ampla de desenvolvimento comunitário. Eu discorri e eles “correram”... Literalmente.
Nunca mais tive o prazer de me reunir com aquela turma, que desapareceu como
que por encanto. Pois é muito mais cômodo distribuir dinheiro, cheques ou
cartões de débito – e ganhar votos - do que fazer um trabalho comunitário, que
muitas vezes é penoso e até vai conscientizar o povo, expor as fragilidades dos
serviços públicos prestados pelas diferentes esferas administrativas
governamentais, seja por omissão, duplicidade ou falta de coordenação.
A propósito, deve-se reconhecer os progressos do BF nos três
últimos anos, implementando ações e programas complementares que objetivam o
desenvolvimento humano das famílias beneficiárias, de modo que consigam superar
sua situação de vulnerabilidade. O esforço ainda é tímido mas o caminho é
correto e promissor.
De qualquer forma, no momento, a questão é outra, muito
séria e preocupante: a dificuldade de continuar pagando o benefício, nos níveis
atuais, pois o Governo Federal gasta mais do que arrecada e marcha a passos
largos para a irresponsabilidade fiscal, apavorando os investidores nacionais e
estrangeiros. Ultimamente só dá notícia ruim: déficit de 20 bilhões em
setembro; inflação em alta; saldo negativo na balança comercial, apesar de o
agronegócio estar vendendo horrores para a Rússia, Arábia Saudita e outros
compradores novos (carne de frango e suína); arrecadação e produção em queda
acelerada na indústria, pouco competitiva; aumento dos juros, da gasolina e da
energia elétrica e assim por diante...
Como consequência, serão reduzidos drasticamente, de início,
alguns benefícios previdenciários e certamente o Abono Salarial e o
Seguro-Desemprego, que o Governo Lula elevou desmesuradamente a partir de 2003.
Esses aumentos despropositados, demagógicos, foram feitos exaurindo os recursos
do FAT, desviando-os do Programa de Qualificação do FAT (Ministério do
Trabalho), causando o gravíssimo “apagão de mão de obra” que já dura anos e agora o Governo tenta compensar com o
PRONATEC, no qual está colocando verbas vultosas, sem os controles adequados.
É claro que a redução do Bolsa Família (BF) não será anunciada/confessada
pelo Governo. Seguirá uma estratégia gradual, disfarçada, que paradoxalmente até
pode colocar o programa no trilho certo. Assessorando o Governo Federal,
sugerir-se-ia os seguintes passos:
·
O Governo
Federal sabe que há muita fraude no programa: várias famílias estão
recebendo há tempos a BF sem atenderem aos critérios estabelecidos de renda e/ou
às denominadas “condicionalidades”. Há de tudo: intrigantes afirmam que até
gatos, e funcionários públicos recebem o BF! Mas antes das eleições a ordem era
“pegar leve”, pois o programa era o grande trunfo no pleito presidencial.
Passado o susto da derrota, chegada a hora de pagar a conta, inicia-se o “virtuoso”
combate à fraude, que constitui a primeira fase da operacionalização do plano
de redução do BF e que já está em pleno andamento. No momento, o Ministério de
Desenvolvimento Social (MDS) faz a chamada Revisão Cadastral e espera por informações
sobre 580 mil famílias que ainda precisam ser atualizadas pelas prefeituras até
meados de dezembro. Está lá no site do MDS, textualmente: “A Revisão Cadastral
garante que as informações declaradas pelas famílias no Cadastro Único estejam
atualizadas. Com dados de maior qualidade, é possível avaliar se o beneficiário
do Bolsa Família ainda atende às condições necessárias para continuar a fazer
parte do programa. E, dependendo das mudanças na situação da família - como,
por exemplo, alteração de renda, mortes ou nascimentos -, ela pode ter direito
a um valor diferente daquele que recebia antes de atualizar o cadastro.” Esse
recadastramento será agora acelerado, de modo a remover do BF o maior número
possível de beneficiários que não atendem às exigências, para assim reduzir sua
despesa mensal. Uma boa ideia, combatendo a corrupção miúda: em outubro de
2014, 13.982.036 familias participantes do BF receberam R$ 2.372.284.427,00 dos
cofres federais.
·
O Governo
sabe que muitos trabalhadores recusam-se a ter suas carteiras de trabalho registradas (“assinadas”), permanecendo
na informalidade para omitir sua renda real, a qual, declarada, os faria perder o benefício da BF: atacando
nessa frente, o Governo intensificará a fiscalização de todos aqueles que não
assinam as carteiras de trabalho de seus empregados. Essa fiscalização atingirá
micro e pequenas empresas mas será sobretudo severa em relação às famílias que
contratam empregadas domésticas, pois esta classe profissional concentra
numerosos beneficiários irregulares do programa BF. A regulamentação da PEC das
domésticas – que foi um dos muitos “golpes de mestre” que o PT deu, visando
aniquilar a classe média - será o pretexto para deflagrar esse tipo de ação
coercitiva. Portanto, dona de casa, cuidado! Os fiscais, comissários do povo, baterão
à sua porta, como nos bons tempos do comunismo, antes da Queda do Muro. E as
punições serão exemplares.
·
O Governo
intensificará a partir de agora a qualificação profissional dos jovens e adultos
beneficiários do BF e sua colocação no mercado de trabalho. Essa medida,
denominada de “inclusão produtiva”, deveria ter sido implementada desde a
primeira hora do programa BF, ainda no Governo FHC. Com essa boa prática,
muitas famílias elevariam sua renda, graças aos salários recebidos,
conquistando autonomia financeira e deixando o programa. O caminho já está
sendo trilhado. O MDS transfere recursos aos municípios, para ajudar a inserir
os usuários da assistência social no mundo do trabalho, seja por meio do
emprego formal (com “carteira assinada”), do empreendedorismo individual
(trabalho “por conta própria”) ou de empreendimentos de economia solidária
(como as cooperativas).
Enfim, talvez a escassez de recursos venha a aprimorar um
programa que os políticos utilizaram mais como um instrumento eleitoral do que
uma ferramenta de equidade e ascensão social.