Nestes tempos de falta de confiança dos grandes
investidores, atormentados por um Congresso tipo “toma lá dá cá”, um Executivo
impopular e um Judiciário dizendo “nem isto nem aquilo, muito pelo contrário”,
verifica-se com satisfação que empreendedores mais modestos ainda acreditam no
futuro deste país em crise.
Um tipo de negócio do meu tempo de criança, que parecia
estar desaparecendo, surge agora com grande dinamismo e nova roupagem: a
barbearia, com ou sem adendos. Esse ressurgimento na área de serviços ocorre
até mesmo no Estado do Rio de Janeiro onde, além da crise, grassou a mais
daninha e bilionária onda de corrupção, envolvendo Governos e PETROBRAS –
empresa que retardou seus projetos por força de um endividamento recordista até
mesmo no âmbito mundial e que iria investir pesadamente no território
fluminense, em especial no COMPERJ.
As barbearias ressurgem por todos os lados, certamente como
exigência da nova moda masculina: utilizar o couro cabeludo como uma tela, inovação
cujo pioneirismo deve ser atribuído por justiça aos jogadores de futebol,
modelos de uma parte considerável de nossa juventude, certamente maravilhada
com seus impressionantes exemplos de rápida ascensão social e econômica.
Mas não é só moda: a nova vaga tem muito de utilitária.
Gerações que não conviveram desde cedo com a navalha, largamente usada para
barbear nos meus tempos de criança, não adquiriram a intimidade necessária para
lidar com o temível instrumento. Assim, dificilmente se adaptariam ao seu uso
nestes tempos de correria em busca do nada e do talvez... Manuseá-la e
manejá-la como instrumento artístico e seguro exige agora uma qualificação
específica, de caráter profissional e o domínio dessa técnica gerou uma boa
oportunidade de negócio para os iniciados.
Outro fator influente é a impossibilidade, no Brasil, de se
fazer uma boa barba, econômica, no ambiente doméstico. As tentativas
tecnológicas, com barbeadores elétricos, fracassaram e as lâminas... são caras
e de qualidade inferior até ao SUS e à nossa educação básica nas escolas
públicas.
Linha do tempo: quando trabalhei no IPEA, de 1965 a 1972, a
instituição recebia farta assistência técnica do exterior e muitos
especialistas estrangeiros eram nossos colegas no dia a dia do escritório. As
viagens deles e nossas eram uma constante, para os Estados Unidos e para a
Europa. Na véspera das partidas sempre havia aquela oferta amiga: a de trazer pequenas
e leves encomendas para os colegas de trabalho. E não dava outra: dois pedidos
principais, invariáveis, de pasta para dentes sensíveis e lâminas de barbear. O
primeiro porque não havia similar nacional do creme dental; a segunda, pela
gritante diferença de qualidade, as nossas lâminas sendo muito inferiores às da
mesma marca e modelo vendidas nos países onde há controle de qualidade para
valer.
A multinacional que fabrica o milagroso creme dental, de uma
eficácia espetacular, rapidamente identificou o promissor mercado brasileiro e
passou a fazê-lo localmente, com a mesma qualidade do produto vendido no
resto do mundo e resultados fabulosos. É um sucesso.
Quanto às lâminas de barbear, 50 anos depois, continuam sendo de péssima
qualidade no Brasil, prometendo na publicidade uma performance que nem de longe
atingem. Dá aos consumidores a impressão de que esse produto jamais teve sua
qualidade testada pelos órgãos responsáveis. Será que o INMETRO não tem o
equipamento adequado para fazê-lo?
Liberal na área econômica, considero muito útil a presença
de multinacionais no setor produtivo
brasileiro, pois nos trazem investimentos, empregos, avanços tecnológicos e
competição. Mas há exceções...
Ainda bem que no caso em foco essa “multinaciomal” fez
tantas “barbeiragens” que acabou reabilitando um tipo de negócio que parecia
obsoleto.