sexta-feira, 16 de outubro de 2015

FAZENDO ECONOMIA OU PLANEJA AUMENTO?

A dívida brasileira, mesmo rebaixada pela Fitch e Moody´s e jogada no lixo pela Standard & Poor’s  seria – sim! - reciclável...desde que o país fosse governado de modo competente. E aí mora o perigo... O problema, na origem, é desvendado pela definição indesmentível desde Maquiavel: “A política é a arte de agradar à maioria...” Foi seduzindo a massa majoritária de eleitores, desinformados e de boa fé, que chegamos ao populismo esquerdista e à ruina dos cofres públicos. E ainda há quem queira persistir iludindo o povo. Só que os brasileiros pobres já estão sofrendo e não mais cairão nessa conversa fiada de que existe almoço de graça.
Velhos tornam-se refinados chatos quando dizem “já vi esse filme” ou “vivi essa história”. Infelizmente, para contar o que pretendo, terei de correr o risco de protagonizar esse tipo abominável – o chato - do qual, aliás, fugi desesperadamente durante toda minha vida.
No início de 1964 pipocavam as greves, havia muito quebra-quebra e os “pelegos”, sindicalistas amestrados, com suas bandeiras vermelhas, embora minoritários, agitavam as praças das cidades, invadiam propriedades rurais e gritavam slogans comunistas pedindo “reformas de base”, sem que explicassem bem do que se tratava. A tática de sempre... Quando já não aguentava tanta ousadia e desfaçatez, a maioria silenciosa do povo brasileiro foi às ruas, gritou e pediu socorro às Forças Armadas. E assim aconteceu a Revolução de 31 de março. Transformado em Colégio Eleitoral, o Congresso realizou a eleição presidencial no dia 11 de abril, dando 98% dos votos ao General Humberto de Alencar Castello Branco. A situação brasileira era caótica. Castello Branco chamou Otávio Gouveia de Bulhões, reputado professor de perfil conservador, para ser Ministro da Fazenda. Ciente do caos do setor público,  criou o cargo de Ministro Extraordinário para o Planejamento e Coordenação Geral e entregou-o a Roberto Campos, competente diplomata e economista formado na Universidade de Columbia, com fortes pendores reformistas, defensor da livre iniciativa. Desde logo ficou certo que Roberto Campos seria o principal gestor e coordenador da economia brasileira. Bulhões e Campos encontraram um país destruído e fizeram, no curto mandato de três anos do Presidente Castello Branco, reformas acertadas e de grande profundidade. Pavimentaram o terreno para que o Brasil, nos anos seguintes, crescesse a “taxas chinesas”. Eram grandes amigos, se respeitavam mutuamente, discutiam à exaustão os grandes temas do momento brasileiro, mas uma coisa era certa: Roberto Campos era o Ministro hegemônico na economia, só não opinava em relação às Forças Armadas e à área política. Decisão correta do Presidente Castello Branco: a economia não admite ambiguidades e um militar pode bem compreender as contradições geradas pela duplicidade de comando, na efervescência da batalha.
Trabalhei com o Ministro Campos, na construção do IPEA. No início meu escritório foi no prédio do Ministério da Fazenda, na Avenida Presidente Antonio Carlos, no Rio de Janeiro. O Gabinete do Ministro Roberto Campos ocupava um andar naquele edifício. Inquilino do Ministro Bulhões, Campos, quando possível, almoçava com ele no salão do terraço.(1)

(1)      Muito jovem, eu exultava quando tinha a honra de ser convidado para esses almoços importantíssimos, no belo terraço do velho prédio do Ministério da Fazenda, de onde se tem uma vista deslumbrante da Baía de Guanabara. Acontecia quando eu tinha que apresentar um projeto ou uma ideia nova para as áreas de educação e emprego.

MATOU O GOVERNO E FOI AO CINEMA
Em maio de 2015, o Ministério da Fazenda anunciou a criação de um sistema de avaliação do gasto público e nasceu a esperança... Era medida indispensável para um Estado inchado por força da ideologia esquerdista dos detentores do poder nos últimos vinte anos. E esperança de que o contribuinte brasileiro seria poupado de ver seu dinheiro escorrer pelos ralos imundos da corrupção e da fraude, além de desperdiçado por ações  descoordenadas, realizadas por múltiplos órgãos que não seguem um plano global nem se comunicam entre si, executando: (a) programas superpostos parcialmente; (b) programas em duplicidade;  (c) projetos com objetivos contraditórios; (d) projetos conflitantes; (e) projetos irrelevantes. Em sua maioria dispensáveis,  mas pesando – e muito – no déficit do setor público brasileiro, alimentado pelo populismo que engana e sufoca nosso povo.
Passados alguns meses daquele anúncio, verifica-se com tristeza que o Ministro da Fazenda não atingiu o objetivo então declarado: foi derrotado e os cortes propostos para as despesas governamentais serão irrelevantes. O Estado continuará com a voracidade pantagruélica que o levou à falência e os problemas ora sentidos perpetuar-se-ão, não havendo CPMF que lhes dê jeito! Muito menos aquela paga na entrada de cinema que lhe vi sacar do gestual canhestro, em cadeia nacional - tão pequenina, coitada! Infelizmente, ingresso para rever um filme que já amargamos antes.
Não é possível tirar o país da situação crítica em que se encontra se a política econômica é ambígua, se seu comandante tem um rival bem próximo que dá palpites e é do tipo “gastador”.
No Governo Figueiredo, Mario Henrique Simonsen era Ministro do Planejamento, segurando as despesas públicas para evitar a moratória. Correndo por fora, como singelo Ministro da Agricultura, mas com grande ambição de poder e especial competência para ocupar espaços políticos, Delfim Neto tornou-se o arauto dos colegas gastadores. Em poucos meses conquistou seus pares, sob o olhar aquiescente do Presidente Figueiredo, um expert em hipologia.
Uma certa sexta feira, percebendo com seu cérebro de gênio, o que estava ocorrendo, Simonsen deixou em Brasília uma carta com seu pedido de demissão e veio para Ipanema. No sábado nos encontramos na praia e comemoramos sua libertação daquele inferno astral.

Delfim, competente, foi empurrando a situação com sua portentosa barriga e o Governo Figueiredo acabou pouco antes do dinheiro.  Mas o Brasil “quebrou” e pediu moratória logo adiante, depois que Sarney subiu ao poder. 

segunda-feira, 12 de outubro de 2015

ENFRENTANDO O DESEMPREGO (II)

Nosso mercado de trabalho vive um de seus piores momentos de todos os tempos.
Comecei a trabalhar com diagnósticos e formulação de políticas públicas de emprego, treinamento e educação no Brasil a partir de meu ingresso no Ministério do Planejamento, em 1965, quando recebi do Ministro Roberto Campos a missão de criar um Setor de Desenvolvimento Social no IPEA. Desde então tenho observado que sempre que o desemprego cresce em nosso país – como acontece neste momento, em que a taxa passou de 8,6% e infelizmente se aproxima rapidamente dos dois dígitos – começam a aparecer, na mídia, insistentes notícias sobre a existência de numerosas vagas no mercado de trabalho que não são preenchidas por falta de candidatos qualificados. Parece mais uma tentativa de atribuir a culpa do desemprego aos trabalhadores e não à péssima gestão de nossa economia pelo Governo Federal, como seria justo. Há um aspecto positivo nessas notícias que implicitamente alertam os desempregados para a necessidade de buscar uma qualificação maior. Há muitas oportunidades gratuitas para aperfeiçoamento e especialização de nossa mão de obra e os trabalhadores devem aproveitá-las para ampliar sua empregabilidade. Entretanto, creio que essas notícias são falaciosas e há duas ordens de razões para reforçar esse raciocínio. Primeiro, porque se existissem essas vagas, não preenchidas em virtude da falta de mão de obra qualificada, o mercado reagiria rapidamente, pois o Brasil conta com o eficiente Sistema S atuando na área de treinamento e seus organismos – SENAI, SENAC, SEBRAE, SENAR, SENAT – mantêm contato permanente com os setores de produção, conhecendo prontamente suas necessidades mais urgentes de pessoal. Segundo, porque as demissões recentes  não poupam sequer os trabalhadores mais qualificados, estando estes portanto disponíveis – ávidos mesmo - para preencher eventuais lacunas existentes no mercado, até em ocupações que exigem um perfil profissional mais modesto. O mais provável, nesse caso, é que esteja funcionando uma outra lei do mercado, aliás óbvia: havendo excesso de oferta de candidatos às rarefeitas ocupações disponíveis, as empresas se tornam mais exigentes, pedem maior escolaridade, preferem mais proximidade entre a morada do empregado e seu local de trabalho, oferecendo além disso remuneração menor que a praticada anteriormente. Os serviços de intermediação de mão de obra tentam, por outro lado, flexibilizar essas exigências do empregador mas  nem sempre o conseguem.
Na realidade brasileira atual, ao contrário, faltam vagas e sobram candidatos. Segundo pesquisa do IETS (Instituto de Estudos de Trabalho e Sociedade), utilizando dados da PNAD Contínua, há 13,1 milhões de casas no país (mais de 19% do total) em que nenhum de seus membros trabalha, o que dá a medida da crise brasileira e do estado precário do mercado de trabalho. Essas famílias, em sua maioria,  vivem das parcas pensões do INSS ou recebem o salário mínimo do Benefício de Prestação Continuada, ou ainda, o que é pior, sobrevivem graças ao Bolsa Família. Desde junho de 2014 os valores deste programa não são reajustados e nesse período a inflação já passou de 10% - um desastre para as famílias que vivem desse benefício, mas um resultado lógico da tolerância anterior com a fraude, que inflou o número de beneficiários do programa, alimentando a grande mentira eleitoreira, que agora se tornou insustentável.
Um gozador me disse recentemente que “as coisas estão tão feias no mercado de trabalho que até as EMPREGADAS estão ficando  DESEMPREGADAS!”. Verdade, resultado claro da badaladíssima PEC DAS DOMÉSTICAS!
Antigamente, nos lares mais humildes, funcionava assim: quando o país entrava em crise e o chefe da casa perdia seu emprego e a capacidade de sustentar a família, sua esposa saía em campo, buscando e logo conseguindo um emprego como doméstica; nas emergências, quando a família ficava com uma renda muito baixa, que ameaçava o atendimento às suas necessidades básicas, a mulher ia à luta, em busca de um emprego de doméstica. Podia ser, eventualmente, a filha mais velha do casal que se tornava doméstica e o arrimo de família. O certo é que essa receita dificilmente falhava. Sempre cabia mais uma empregada nos lares brasileiros. Agora, não funciona mais: a demanda por empregadas domésticas tradicionais está em baixa. Os patrões só aceitam as diaristas e olhe lá!  Até o mercado imobiliário, que raciocina a longo prazo, já entendeu os novos tempos. Imóveis em construção ou em primeira locação já não têm mais dependências de empregadas, o que reduz  seus preços de venda em até 10%. E talvez esse seja o único benefício resultante da tal PEC até o momento – aliás, um benefício exclusivo para os patrões. Quanto àquela numerosa categoria ocupacional das domésticas, só lhe restaram problemas: fim dos empregos com casa e comida incluídas; redução dos salários reais; desemprego em alta; alteração radical no perfil de competências atualmente pedido a essas profissionais, inclusive porque novas candidatas, na crise, têm perfil educacional mais elevado.
Empregados domésticos são atualmente 6.046.000,  representando 6% da força de trabalho do país (que totaliza 100.807.000 trabalhadores).  Se considerarmos apenas a parte da população que está ocupada, empregados domésticos são 6,6% do total em atividade. Um contingente numeroso, ameaçado pela promulgação de uma legislação que assemelha os lares brasileiros a empresas e complica (até inviabiliza) a absorção dessa mão de obra. É preciso contratar um contador para cuidar da burocracia gerada pelas novas relações de trabalho com as empregadas domésticas! Coisa considerada simples por essa turma que está no poder!
O desastre é bem nítido. Segundo a PNAD Contínua, os empregados domésticos ocupados eram 6.002.000 no trimestre de maio a julho de 2014 e passaram a 6.046.000 no trimestre maio-julho de 2015 – um acréscimo de apenas 44 mil trabalhadores nessa ocupação, passado um ano. No mesmo período, a População em Idade de Trabalhar no Brasil  passou de  161.942.000 a 164.248.000 pessoas – um aumento de  2.306.000 potenciais trabalhadores, dos quais provavelmente mais de 140 mil seriam candidatos a empregos domésticos.
A queda dos postos de trabalho formais nesse intervalo de um ano atingiu a cifra de 927 mil. Os empregos informais, exercidos sem carteira assinada, também diminuíram em 181 mil postos. Na tentativa de obter alguma renda, empregados demitidos passaram a trabalhar por conta própria, de tal modo que seu número passou de 21.228.000, em 2014, para  22.111.000, em 2015 – um aumento de 883 mil pessoas.

Lembro que quando ouvi falar dessa tal PEC das Domésticas pela primeira vez, lá estavam na TV, radiantes, políticos populistas, que se apresentavam como  grandes articuladores da nova legislação. Imaginei que devia ser uma obra de péssima qualidade, tal a tradição de incompetência das tristes figuras presentes. Não deu outra!

VIAGEM AO PASSADO

O Irã está na moda e minhas recordações daquele país mais vivas do que nunca... Estive no Irã em 1976, para participar da Conferência In...