segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

DE VITÓRIAS E DERROTAS

Ao longo da vida, como é natural, perdi  e ganhei muitas vezes. Nada de dramático, porém. Pratiquei esporte de competição desde cedo. Aos 7 anos de idade, joguei minha primeira partida de futebol com uma camisa de time. Lembro bem de tudo: era vermelha e branca, ganhamos de um a zero e eu fiz o gol da vitória por 1 x 0, mergulhando de “peixinho” entre dois beques e cabeceando. Foi um dia de glória, ali na esquina da Montenegro  da velha Ipanema com Rua Alberto de Campos, em um terreno baldio que a garotada  capinou, limpou  e  transformou em campo de futebol. O momento mágico daquele gol é um filme indelével no meu cérebro. O esporte tem esse dom de transformar, na imaginação infantil, um modesto campinho de pelada solitária  em um Maracanã lotado. E tem a virtude maior de nos  ensinar que sua prática  implica na alternância entre alegrias e frustrações. O esporte resulta em um aprendizado permanente  que afinal faz compreender que existem valores maiores que a vitória e o sucesso. E que muitas vezes, a derrota é a melhor opção, o caminho único a ser trilhado conscienciosamente.
Duas das minhas derrotas voltaram à lembrança nos últimos dias. A  crise da água no coração econômico do Brasil, transportou-me para os anos 60, quando eu trabalhava no IPEA, dirigindo a área de recursos humanos. Tentei sensibilizar a Direção do órgão para que criasse um Setor de Recursos Naturais. Essa iniciativa colocaria nossas questões ambientais na ordem do dia, com décadas de avanço em relação ao que aconteceu (tardiamente) no Brasil. Levei o Presidente do IPEA, João Paulo dos Reis Veloso, para almoçar no Restaurante Astrodome com José Cândido de Carvalho – então o maior conhecedor de nossa  flora e fauna - e Nilton Veloso, brilhante especialista brasileiro que dirigia a Divisão de Recursos Hídricos da Organização dos Estados Americanos (OEA). Eu já os convencera a se juntarem ao IPEA, mas não consegui o aval de Reis Veloso. Ele me disse que o Brasil era muito rico em recursos naturais e que o tal Setor seria supérfluo. Hoje, lamentamos não ter acordado a tempo para  a Ecologia e toda sua problemática. O IPEA, muito influente quando Roberto Campos (seu criador) e depois Hélio Beltrão foram Ministros do Planejamento,  poderia ter dado a partida em um processo de reflexão duradouro. Vejo  hoje que aquela foi uma derrota importante, pois faltou-me pertinácia, insistência - o que foi lamentável. O Brasil, infelizmente, ainda nem aprendeu quão nobre e valiosa é a água potável, que só deveria ser usada para beber, fazer comida e higiene e como insumo de certas indústrias como a alimentícia e a farmacêutica, por exemplo. O cacique pele-vermelha fez a previsão certa: com o tempo nossa rica civilização vai se afogar em nossa própria sujeira...
Outra derrota importante, que lamento, o Papa Francisco me fez recordá-la ao preconizar a paternidade responsável. Durante o início do ano de 1980 negociei com a CNBB – especificamente com Dom Luciano Mendes de Almeida – a realização conjunta de um projeto de paternidade responsável, no âmbito do PES (Programa de Educação Comunitária para a Saúde) do MOBRAL. Os participantes do PES seriam mobilizados pela Igreja Católica e o MOBRAL, receberiam ensinamentos de nossos monitores sobre  reprodução humana, prevenção de doenças transmissíveis sexualmente,  responsabilidades  da maternidade e paternidade, ciclos de maior ou menor fertilidade etc. A Igreja Católica admitia que fosse transmitido o conhecimento necessário para  evitar a fecundação através do método do “muco vaginal”. Vinda do Vaticano, uma freira especializada no assunto passou meses no Brasil treinando a equipe do MOBRAL Central para o perfeito  entendimento do uso daquele método. O material didático – “A Transmissão da Vida”, prefaciado por D. Luciano - foi impresso e o convênio MOBRAL-CNBB assinado em dezembro de 1980. A partir  daí,  o treinamento foi repassado às Coordenações Estaduais do MOBRAL e chegou aos monitores no campo. Mas... Em 31 de março de 1981 o General Rubem Ludwig, que “estava” Ministro da Educação, resolveu não renovar meu mandato de Presidente do MOBRAL que vencia naquela data. O convênio não teve continuidade. D. Luciano afirmou que foi sua confiança em mim que o levou a assinar o convênio exatamente quando as relações entre os militares e a Igreja Católica eram problemáticas.  Frustrou-se o que seria talvez a maior realização política de minha vida profissional.  O primeiro convênio, no mundo, da Igreja Católica com um órgão público visando a paternidade responsável.

De qualquer modo, fiquei eternamente honrado com a prova de  confiança daquele que, no meu entender, poderia ser o primeiro brasileiro a se tornar Papa, caso tivesse vivido mais tempo. Religioso que, em futuro próximo, meritoriamente, deverá ser beatificado/santificado. E cuja bênção – como sempre aconteceu – continuará  a proteger-me na vitória e na derrota

VIAGEM AO PASSADO

O Irã está na moda e minhas recordações daquele país mais vivas do que nunca... Estive no Irã em 1976, para participar da Conferência In...