sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

BRASIL PISA EM FALSO NA EDUCAÇÃO


Fui convidado pela OECD (Organisation for Economic Co-operation and Development) para participar do webinar (Seminário pela internet) de 4 de dezembro de 2013, no qual Andreas Schleicher (Deputy Director for Education and Skills da OECD) apresentou seus comentários técnicos sobre os resultados do teste de PISA realizado em 2012 . Aplicado em mais de 510 mil estudantes com idades entre 15 e 16 anos, residentes em 65 países, o PISA é considerado atualmente o melhor aferidor internacional da qualidade comparada da educação básica. O Brasil se saiu muito mal, assim como nos testes anteriores de que participou. Não procede o argumento tosco de que o Brasil melhorou sua posição em relação aos testes anteriores, pois o modesto crescimento  de nossas notas deriva de que a base de comparação era muito baixa e piorar era quase impossível.
A OECD merece credibilidade e sempre me pareceu, sob o aspecto técnico, a mais competente das agências internacionais que conheci. E não foram poucas, especialmente ao longo dos 22 anos em que trabalhei no setor público, nas três esferas administrativas (federal, estadual e municipal). Meu primeiro contato com a OECD traz-me recordações curiosas. No início dos anos 60, após minha formatura em Engenharia, eu trabalhava na CONSULTEC – empresa de consultoria econômica de excelente reputação – e eventualmente escrevia artigos para a revista mensal da APEC (Análise e Perspectiva Econômica), dirigida por Victor Alves da Silva Filho, que foi o fundador e primeiro chefe do Escritório de Pesquisa Econômica Aplicada - EPEA (hoje denominado IPEA). Eram matérias variadas, não assinadas, com as quais eu melhorava meu modesto orçamento de recém-formado. Um desses artigos, de 1964, descrevia as características metodológicas do Projeto Regional Mediterrâneo, idealizado e liderado pela OECD, que consistia em um conjunto de planos educacionais para os países então mais pobres da Europa (Portugal, Espanha, Itália, Grécia, Turquia e Iugoslávia). Ao final, meu artigo exortava as autoridades brasileiras a tomarem iniciativa semelhante para a nossa tão combalida Educação. 
Roberto Campos era Ministro do Planejamento e leu o artigo. Interessado, perguntou a Victor da Silva quem o escrevera. Semanas mais tarde, o resultado prático: recebi uma sugestão de Mario Henrique Simonsen, meu colega de trabalho na CONSULTEC, para que aceitasse um cargo no EPEA, onde ficaria encarregado de dirigir a área de Desenvolvimento Social do importante órgão que estava nascendo. 
Aceitei, deixei a CONSULTEC e em fevereiro de 1965 assumi o cargo de Coordenador de Desenvolvimento Social no EPEA. Eu tinha 27 anos de idade, muita vontade e dedicação, trabalhava e estudava arduamente (até mais de 12 horas por dia), mas teoricamente era muito jovem para enfrentar as grandes responsabilidades do posto.  Meses depois de começar a trabalhar, já elaborando o Diagnóstico de Educação e Mão de Obra para o futuro Plano Decenal que o Governo Castello Branco legaria ao sucessor, fui avisado de que receberia a visita de Angus Maddison, técnico-senior da OECD e um dos artífices do Plano Regional Mediterrâneo. Eu o conhecia de nome e pelos seus estudos publicados. Fiquei entusiasmado, pois Angus Maddison era considerado um dos maiores craques desse setor do conhecimento. Recebi-o, conversamos muito, ele me fez diversas perguntas sobre as atividades do setor que eu dirigia. Sempre alegre, com o inconfundível humor britânico, prometeu voltar e assim o fez mais duas vezes, com alguns meses de intervalo. De novo muitas perguntas, sugestões, conjecturas sobre o futuro. Certo dia, sempre bonachão, ao despedir-se, me disse que não voltaria mais. E completou: you are doing very well ! That`s enough ! Bye ! Entendi então que o Ministro Roberto Campos – muito acertadamente – colocou o “cobrão” Angus Maddison para supervisionar meu trabalho, que ele considerava estratégico,  da maior importância para o Brasil.
O último livro de Angus Maddison é notável. Intitulado “Economia Mundial : Uma Perspectiva Milenar”, fornece uma visão abrangente do crescimento e níveis de população mundial desde o ano de 1000. Nesse período , a população mundial aumentou 22 vezes, a renda per capita 13 vezes e o PIB mundial quase 300 vezes.
Os maiores ganhos ocorreram nos países ricos de hoje ( Europa Ocidental, América do Norte , Austrália e Japão) . A diferença entre o líder mundial - os Estados Unidos – e a região mais pobre - África - é agora de 20 para 1 . No ano de 1000, os países ricos de hoje eram mais pobres do que a Ásia e a África .
O livro tem vários objetivos: primeiro, é um esforço pioneiro para quantificar o desempenho econômico das nações a muito longo prazo; em segundo lugar, permite identificar as forças que explicam o sucesso dos países ricos e explorar os obstáculos que impediam avanço em regiões que ficaram atrasadas; o terceiro objetivo é o de controlar a interação entre os ricos e o resto, para avaliar o grau em que essa relação foi simplesmente de exploração. “Economia Mundial : Uma Perspectiva Milenar” é um "must " para todos os estudiosos da economia e da história econômica , enquanto que o leitor comum vai encontrar muita coisa interessante e fascinante. É também uma  monumental obra de referência.

3 comentários:

  1. Ler seus artigos sempre foi e é para mim uma oportunidade de aprendizado.
    No caso mais específico deste seu texto, fico com a sensação de que não vou ter tempo para ver o salto qualitativo da educação brasileira. Pelo andar da carruagem e dos dados acho que serão necessários mais de 50 anos, quiçá 100, para o contexto educacional brasileiro mudar e atingir resultados significativos, importantes. Fico triste e, embora tenha dedicado 47 anos da minha existência à Educação, já não sei mais (existiram momentos que acreditei que poderia e estava contribuindo) como contribuir (e sem ser prepotente, gostaria sim de contribuir) para fazer tudo isso mudar. Nos últimos tempos tenho me dedicado a pesquisar sobre práticas pedagógicas com a esperança de poder encontrar e partilhar alguns caminhos na perspectiva da construção de uma educação mais antenada não só com as necessidades e interesses das crianças e jovens de hoje como com as demandas de nosso tempo. Com certeza, a leitura que você sugere me interessa, uma vez que não dá para pensar educação fora de uma análise mais cuidadosa do contexto e das diferentes dimensões, inclusive econômica, que com ela dialogam. Que bom poder retomar nosso diálogo por meio de seu blog.

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    1. Cara Adélia: você fez a sua parte e fez bem. Quem sabe ainda não viveremos para ver nossa educação melhorar ? A partir de agora escreverei sobre Qualidade da Educação com frequência neste blog e espero contar com suas ideias e opiniões. Grato pelo comentário, Arlindo.

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    2. Pode contar comigo. Vai ser um ótimo diálogo.

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