sexta-feira, 7 de março de 2014

ESPORTE E EDUCAÇÃO DE QUALIDADE

Ensino de qualidade tem que incluir a educação física como matéria obrigatória e propiciar oportunidades reais de prática desportiva aos estudantes.
Quando fui membro do CFE - Conselho Federal de Educação (atual CNE -  Conselho Nacional de Educação), no início da década dos 70, participei da elaboração da Reforma do Ensino Primário e Médio, consubstanciada na  Lei no 5.692, de 11 de agosto de 1971. Lutei  e votei pela obrigatoriedade da prática da educação física e desportiva no sistema educacional brasileiro. Posteriormente, aprovada a lei,  fui  escolhido Relator da regulamentação dessa obrigatoriedade no Conselho. À época eu dirigia o CNRH – Centro Nacional de Recursos Humanos do EPEA (hoje IPEA) que produziu o I Diagnóstico da Educação Física e Esportes no Brasil e que a seguir coordenou a elaboração do I Plano Nacional de Educação Física e Esportes, um marco histórico desse setor.  Minha informação a respeito estava bem atualizada.  Atleta de voleibol do Fluminense e ex-jogador da  Seleção brasileira, meus colegas  do CFE consideraram minhas credenciais suficientes  para que eu realizasse o trabalho. Fui assessorado  pelos Professores Lamartine Pereira da Costa e José Garcez Ballariny, do EPEA, cuja colaboração foi decisiva.
Ao correr  do tempo, não só pela evolução tecnológica da sociedade moderna – um convite permanente e sedutor  ao sedentarismo – mas pela minha própria observação  do cotidiano – verificando que a boa qualidade de vida está  no equilíbrio entre trabalho e lazer, atividades físicas e intelectuais – considero que aquela legislação do CFE foi uma ótima contribuição à educação  brasileira.  Esporte e educação física são fundamentais para nossa formação.  
O esporte tem notável  influência positiva na socialização, na saúde física e mental, contribui para uma visão equilibrada e regrada da competição, impõe a aceitação da natural alternância entre vitórias e derrotas durante a vida, estimula o companheirismo, a lealdade, a pertinácia e beneficia  muitos aspectos importantes da esfera psicossocial. O esporte  é um efetivo antídoto contra a proliferação das drogas e da violência, além de um fator de ascensão  social cada vez mais importante, à medida que o esporte escolar vai permitindo aos adolescentes e jovens pobres a oportunidade de revelar seus talentos. O  que não acontece com os dotes intelectuais dos alunos carentes, sufocados por uma escola de má qualidade, que não oferece a base de conhecimentos de que necessitam para tentar o ingresso na Universidade e trilhar os caminhos nobres da ciência, da tecnologia e da prática profissional de ponta. Na escola de qualidade vão surgir as vocações de futuros atletas  - que irão percorrer o trajeto esporte-profissão, entrando em  um importante segmento do atual mercado de trabalho e das  relações  internacionais, cujas tendências futuras de crescimento são  extremamente promissoras.
 Na escola de qualidade também devem nascer  os hábitos da prática sadia da atividade física para toda a vida e a educação da educação física presta-se maravilhosamente às abordagens transversais, que permitem enfocar problemas sérios que crescentemente vão acometendo nossa sociedade. Temas não faltam: o combate aos vícios em geral, seja do  uso de drogas lícitas (como o fumo e o álcool) como das ilícitas; a conscientização acerca da futilidade do falso culto ao corpo; o perigo dos excessos comuns em  alguns centros de preparação física, tanto na intensidade dos exercícios em si quanto no  uso de substâncias que prometem força e beleza a curto prazo, mas cobram um alto preço em saúde. Todas essas questões têm que ser enfocadas pelos bons professores de educação física com seus alunos - crianças, adolescentes ou jovens.
Não custa repetir que são múltiplas e cada vez mais eloquentes as pesquisas na área médica consolidando a atividade física como um dos mais importantes fatores de higidez, de melhoria  da qualidade de vida e aumento da longevidade. Embora ainda sujeitas a controvérsias, investigações recentes tendem a mostrar a igualmente  importante  contribuição dos exercícios físicos para o desenvolvimento  do intelecto.  Pesquisadores da Escola de Medicina da Universidade de Boston (BUSM) encontraram evidências de que a atividade física é benéfica para a saúde do cérebro e para a cognição. Certos hormônios,  secretados durante o exercício, ajudariam a melhorar a memória.  Em outro estudo, publicado em outubro de 2013, o Dr. Bruce Spiegelman, do Instituto Dana-Farber  Cancer  e Harvard Medical School relatou que uma molécula chamada FNDC5 e seu subproduto, irisina, tornam-se elevadas no cérebro quando fazemos  exercícios de resistência.  Spiegelman e a sua equipe também descobriram que aumentos nos níveis de irisina estão na origem da melhoria da capacidade da neurogênese  - crescimento de novos neurônios. Querendo saber mais, leia o Apêndice.
MENS SANA IN CORPORE SANO
Tive o privilégio de estar no sítio arqueológico  de Olímpia, cidade-berço da  competição entre os maiores atletas da Grécia Antiga, origem  das Olimpíadas modernas.   Foi em  776 a.C  que se realizou o primeiro torneio, que se repetiria de quatro em quatro anos, suspendendo as guerras eventualmente em andamento,  até que o imperador romano Teodósio I o suprimiu em 394. Senti uma intensa emoção ao visitar o estádio e imaginar como seriam  então os Jogos, origem de um tipo de atividade humana que me deu tantas alegrias, oportunidades e inculcou-me a perseverança e muito vigor para a luta por toda a vida. Recordei  que ali se fundiam, harmoniosamente,  esporte e arte. Fídias, o maior dos escultores gregos, mantinha em Olímpia um ateliê que ocupava durante os Jogos, ao lado do Templo de Zeus.  Deus que Fídias representou em  uma gigantesca estátua em marfim e ouro, considerada uma das sete  maravilhas do mundo antigo.
Durante muito tempo, vários Diretores de escolas brasileiras apresentavam a falta de espaço como álibi para não oferecer a atividade esportiva a seus alunos.  Conversa fiada... Escola cujo objetivo  seja ministrar ensino de qualidade inclui os esportes  e  a educação física dentre as atividades preferenciais oferecidas a seus alunos, usando de todos os meios para consegui-lo. No site  http:// www.procrie.com.br   -  mantido pelo Professor Roberto Pimentel  - qualquer interessado obterá, por exemplo,  as informações pertinentes para usar o minivoleibol como centro das atividades esportivas/educativas na escola, com a grande vantagem da ampla abrangência etária de praticantes potenciais, dos baixos custos dos materiais  usados e dos pequenos espaços requeridos para sua prática. Melhor ainda se o Prefeito se interessar em obter uma assistência técnica específica de Roberto Pimentel  para sua implantação no sistema de ensino público do Município.

APÊNDICE: “Exercising Intelligence: How research shows a link between physical activity and smarts”. Autoria de Jay Bonaretti        
Um grande estudo realizado na Academia  Sahlgrenska e pelo  Hospital Universitário Sahlgrenska , em Gotemburgo , na Suécia, revela que os jovens adultos que se exercitam regularmente têm escores de QI mais altos e são mais propensos a ingressar na universidade .
O estudo foi publicado na revista Proceedings, da Academia Nacional de Ciências (PNAS) , e envolveu mais de 1,2 milhões de homens suecos . Os homens estavam realizando o serviço militar e nasceram entre os anos de 1950 e 1976 . Ambos os resultados dos testes físicos e de QI foram revisados ​​pela equipe de pesquisa . Os resultados da análise revelam uma clara ligação entre a aptidão física e os resultados dos testes de QI. Em particular, a compreensão verbal e o pensamento lógico mostram maior associação com a aptidão. No  entanto , a força não foi associada com um aumento no QI.
"Estar em forma significa que você também tem bom coração e capacidade pulmonar e que seu cérebro fica cheia de oxigênio ", diz Michael Nilsson, professor da Academia Sahlgrenska e médico -chefe do Hospital da Universidade de Sahlgrenska . "Esta pode ser uma das razões pelas quais nós podemos ver uma ligação clara com a aptidão , mas não com a força muscular. Nós também observamos  que existem fatores de crescimento que são importantes."
Os pesquisadores também analisaram os dados de gêmeos e concluíram que fatores ambientais são mais importantes que a genética na associação entre QI e fitness. "Também mostramos que esses jovens que melhoraram  a sua aptidão física entre as idades de 15 e 18 anos também  aumentaram o seu desempenho cognitivo ", diz Maria Åberg , pesquisadora da Academia Sahlgrenska e médica no Centro de Saúde DBY. " Sendo este o caso , a educação física é um assunto que tem um lugar importante nas escolas, e é uma necessidade absoluta , se quisermos obter  bom desempenho em matemática e outras disciplinas teóricas. "
Outro resultado interessante da análise foi a descoberta de que aqueles que estavam mais aptos na idade de  18 anos eram mais propensos a frequentar a universidade e a encontrarem melhores empregos no mercado de trabalho.
O estudo foi realizado no Centro de Reparação e Reabilitação Cerebral de Gotemburgo, em conjunto com o Karolinska Institutet .

Referência: Aberg MA, Pedersen NL, Toren K., Svartengren M., Bäckstrand B., T. Johnsson , Cooper- Kuhn CM , Aberg ND, Nilsson M., Kuhn HG (2009). Aptidão cardiovascular está associada com a cognição na idade adulta jovem . Proc . Natl . Acad . Sci . U.S.A. 106 , 20.906-20.911 (“Exercising Intelligence: How research shows a link between physical activity and smarts” in Site http://www.ironmanmag.com.au, Capturado em 06/03/2014)

6 comentários:

  1. Arlindo,
    Estarei vinculando seus artigos maravilhosos não só no Procrie, como também no CEV - Centro Esportivo Virtual (cev.org.br/) um dos maiores sítios nacionais sobre Educação Física e Esportes. Agradeço a referência ao meu trabalho, que não é só meu. pois há muita inspiração de sua parte. Neste momento, desenvolvo artigos que tratam exatamente de como resolver problemas baseados nós princípios da heurística de G. Pólya e em design thinking. Façam uma visita e opinem, pois preciso de muita ajuda para a concepção de minhas pesquisas educacionais. Lembrando a todos que tais princípios se aplicam a qualquer atividade humana ou a qualquer desporto. Permaneço seu maior admirador em ciência educacional. Grato por ter-me entre seus amigos.

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  2. Arlindo,
    Agradeço a menção ao trabalho que venho realizando no Procrie em favor de uma Educação Física e Esportes na Escola de Qualidade. Devo consignar que já arrebanhamos, digo assim porque você também faz parte desse time, aproximadamente 180 mil visitas e disponibilizamos pouco mais de 500 artigos que tratam de fornecer material didático e metodológico para professores. Por outro lado, estarei divulgando seus dizeres não só no blogue, como também em outros sítios dos quais sou participante e colaborador, inclusive em Portugal. Grato por mais essa pérola e incentivo.

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  3. A existência, no Brasil, de milhares de "escolinhas" dos mais diversos esportes mostra que há uma enorme demanda reprimida. Parte dessa demanda não atendida se deve à omissão do sistema educacional brasileiro. Mais um indicador de sua baixa qualidade. Parte das "escolinhas" desempenha um papel complementar à escola formal, desenvolvendo e consolidando as vocações esportivas reveladas no sistema de ensino.

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  4. Roberto: seu blog é um sucesso e você merece, pelo seu esforço e o excelente conteúdo que posta. Abraços, Arlindo

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  5. Arlindo,
    Acabamos de assistir à reportagem no Fantástico desse último domingo sobre as escolas nas zonas rurais do Nordeste, nem sempre tão longe do Centro das capitais. Diante da penúria lastimável de hoje e no seu trabalho no MOBRAL de antes, que paralelismo e lições poderia nos brindar?

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  6. Grato Roberto: pretendo escrever sobre isso em um futuro blog, pois creio que a busca pela educação de qualidade deve atacar em todos os flancos e uma escola de ambiente sadio, agradável, com saneamento, boas condições climáticas (naturais ou artificiais) é importante. No MOBRAL lidávamos com uma população muito pobre, que estudava geralmente à noite, em salas improvisadas e precárias. Mas fazíamos o possível. Exemplo: descobrimos que muitos alunos não aprendiam pelo fato de não enxergarem. Fizemos um levantamento dos meios que eram usados para iluminar as salas (luz elétrica, lampião, lamparina, tochas ou velas). Compramos milhares de lampiões e mandamos para todas as salas que não tinham luz elétrica. O MOBRAL usava 150 mil salas por semestre. Posteriormente fizemos a distribuição de 108 mil óculos de grau para nossos alunos no âmbito de nosso Programa de Educação Comunitária para a Saúde (PES). Oftalmologistas voluntários faziam os exames de graça e davam a receita. Enviávamos para uma fábrica de Montes Claros que havia ganho a concorrência, recebíamos os óculos e distribuíamos. Dentro do nosso Programa Tecnologia da Escassez imprimimos um fascículo com dicas ilustradas para melhorar as condições de nossas salas. Pintar ou caiar a sala de branco. Disposição adequada do meio de iluminação e das carteiras ou cadeiras etc etc Mas lembro que o MOBRAL tinha o estilo de campanha, o que é muito distinto do ensino formal, que tem verbas para infraestrutura. O MOBRAL jamais foi proprietário de um único imóvel e jamais alugou salas de aula. Arlindo

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