segunda-feira, 28 de setembro de 2015

AINDA HEI DE COMER DAQUELA FRUTA!

O vandalismo, o descaso com equipamentos públicos urbanos, os ataques ao meio ambiente, a transgressão em geral, são atentados ao bem comum, funcionam ao  inverso do espírito comunitário e têm custos econômicos, sociais e culturais elevadíssimos. Nosso país é um dos campeões nesses desperdícios injustificáveis, os quais agravam ainda mais a crise em que o Brasil está mergulhado.
Tenho aspirações modestas - uma receita de felicidade. Chegado o verão, uma delas brota no horizonte próximo. Comer uma fruta da minha pracinha! Simples assim!  Moro perto do Pomar da Barra, um espaço público municipal, cercado de flamboyants, com muitos gramados onde foram plantadas várias fruteiras, com promessas de colheitas fartas de mangas, jambos, goiabas, cajás, pitangas, jacas, romãs e abacates. Os anos passaram, as árvores cresceram e como sempre acontece com a Natureza deixada em paz e liberdade, florescem e frutificam, produzem em grandes quantidades. Mas os passantes ocasionais como eu jamais comeram um sequer desses bons frutos, pois assim que atingem um tamanho apenas promissor são arrancados por alguém que lhes dá uma mordida, constata a verdidão óbvia e atira-os ao chão, onde já estão muitos outros que antes tiveram o mesmo destino, formando um rastro de destruição. 



São certamente muitos os que cometem essa espécie de vandalismo egoísta, caracterizando a falta total de espírito comunitário – importante instrumento do bem comum. É difícil crer que os “mordedores intempestivos” não percebam que estão se prejudicando a si próprios, pois eles também jamais comerão um fruto saboroso e nutritivo. E que não notem que o Pomar da Barra é frequentado por inúmeros moradores de rua, carentes e às vezes famintos, os quais poderiam beneficiar-se daquelas frutas, estragadas em injustificável ato de desperdício.
Mas ainda tenho esperança. No passado, doía-me observar nas minhas caminhadas que a maioria dos sabiás do Jardim Oceânico, nativos da região, soltavam seu canto triste de prédios, de locais fixos, denotando que eram prisioneiros de gaiolas. Apenas uns poucos nos acordavam com seu piar inconfundível, nos albores da manhã, pousados na mangueira ao lado de nosso quarto. Naquele tempo, identificados seus ninhos, o grande predador humano capturava seus filhotes assim que se aprontavam para o primeiro voo. Minha filha Carla se desesperava e ameaçava os caçadores de nossa rua, invocando as leis ambientais, jamais aplicadas e cumpridas. Com o tempo e a insistência dos professores das escolas do bairro para que os pequenos estudantes “educassem” seus pais para não molestar as avezinhas de canto nostálgico, os hábitos mudaram e hoje o Jardim Oceânico está povoado de uma fauna maravilhosa, canora e colorida. Aqui a Natureza teima em sobreviver, apenas prejudicada pela insistência de alguns síndicos, aos quais as árvores incomodam com suas folhas e sombras que os “inimigos do verde” não tardam a atacar com “podas selvagens” e abates radicais, ordenados a seus porteiros e realizados na calada da noite e no início das alvoradas furtivas.





Hoje, de todo modo, além dos sabiás, beija-flores, sebinhos, cambaxirras, bem te vis, sanhaços, saíras, rolinhas, pardais, canários da terra e gaturamos povoam minha casa às dezenas, todos os dias, subornados pelas nossas muitas árvores intocadas e pelos mamões, bananas, quireras, painços e potes de água com açúcar que lhes destinamos religiosamente.


Baseado nesse precedente promissor, reafirmo minha esperança de que a educação básica brasileira evolua e contribua para a criação generalizada do espírito comunitário em nosso país, missão da qual não pode se furtar, inclusive porque a escola de qualidade deve ser um dos polos geradores do bem comum em sua área de influência. É a fórmula para que se minimize as muitas manifestações de descaso com os bens públicos, de vandalismo, de desperdício, que alimentam uma cultura de infração e desrespeito que domina nosso país, animada pelo exemplo deletério de lideranças políticas populistas, demagógicas e corruptas.
É muito fácil mostrar e demonstrar, na escola, que ao reclamar da falta de bom transporte público por meio da queima de ônibus, da depredação de trens, do roubo de placas de sinalização o maior prejudicado é o seu usuário.
Quando isso acontecer e resultar, hei de comer daquela fruta!


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