O vandalismo, o descaso com equipamentos públicos
urbanos, os ataques ao meio ambiente, a transgressão em geral, são atentados
ao bem comum, funcionam ao inverso
do espírito comunitário e têm custos econômicos, sociais e culturais
elevadíssimos. Nosso país é um dos campeões nesses desperdícios
injustificáveis, os quais agravam ainda mais a crise em que o Brasil está
mergulhado.
Tenho aspirações modestas - uma receita de
felicidade. Chegado o verão, uma delas brota no horizonte próximo. Comer uma
fruta da minha pracinha! Simples assim! Moro perto do
Pomar da Barra, um espaço público municipal, cercado de
flamboyants, com muitos gramados onde foram plantadas várias fruteiras, com
promessas de colheitas fartas de mangas, jambos, goiabas, cajás, pitangas, jacas, romãs e
abacates. Os anos passaram, as árvores cresceram e como sempre acontece com a
Natureza deixada em paz e liberdade, florescem e frutificam, produzem em
grandes quantidades. Mas os passantes ocasionais como eu jamais comeram um
sequer desses bons frutos, pois assim que atingem um tamanho apenas promissor
são arrancados por alguém que lhes dá uma mordida, constata a verdidão óbvia e
atira-os ao chão, onde já estão muitos outros que antes tiveram o mesmo destino,
formando um rastro de destruição.
São certamente muitos os que cometem essa espécie de vandalismo egoísta, caracterizando a falta total de espírito comunitário – importante instrumento do bem comum. É difícil crer que os “mordedores intempestivos” não percebam que estão se prejudicando a si próprios, pois eles também jamais comerão um fruto saboroso e nutritivo. E que não notem que o Pomar da Barra é frequentado por inúmeros moradores de rua, carentes e às vezes famintos, os quais poderiam beneficiar-se daquelas frutas, estragadas em injustificável ato de desperdício.
Mas ainda tenho esperança. No passado, doía-me observar nas minhas caminhadas que a maioria dos sabiás do Jardim Oceânico, nativos da região, soltavam seu
canto triste de prédios, de locais fixos, denotando que eram prisioneiros de gaiolas.
Apenas uns poucos nos acordavam com seu piar inconfundível, nos albores da
manhã, pousados na mangueira ao lado de nosso quarto. Naquele tempo, identificados
seus ninhos, o grande predador humano capturava seus filhotes assim que se
aprontavam para o primeiro voo. Minha filha Carla se desesperava e ameaçava os
caçadores de nossa rua, invocando as leis ambientais, jamais aplicadas e
cumpridas. Com o tempo e a insistência dos professores das escolas do bairro
para que os pequenos estudantes “educassem” seus pais para não molestar as avezinhas de
canto nostálgico, os hábitos mudaram e hoje o Jardim Oceânico está povoado de
uma fauna maravilhosa, canora e colorida. Aqui a Natureza teima em sobreviver,
apenas prejudicada pela insistência de alguns síndicos, aos quais as árvores
incomodam com suas folhas e sombras que os “inimigos do verde” não tardam a atacar
com “podas selvagens” e abates radicais, ordenados a seus porteiros e realizados
na calada da noite e no início das alvoradas furtivas.
Hoje, de todo modo, além dos sabiás, beija-flores, sebinhos,
cambaxirras, bem te vis, sanhaços, saíras, rolinhas, pardais, canários da terra
e gaturamos povoam minha casa às dezenas, todos os dias, subornados pelas nossas
muitas árvores intocadas e pelos mamões, bananas, quireras, painços e potes de
água com açúcar que lhes destinamos religiosamente.
Baseado nesse precedente promissor, reafirmo minha
esperança de que a educação básica brasileira evolua e contribua para a criação
generalizada do espírito comunitário em nosso país, missão da qual não pode se furtar, inclusive porque a escola de qualidade deve ser um dos polos geradores do bem comum em sua área de influência. É a fórmula para que se minimize as muitas
manifestações de descaso com os bens públicos, de vandalismo, de desperdício, que
alimentam uma cultura de infração e desrespeito que domina nosso país, animada
pelo exemplo deletério de lideranças políticas populistas, demagógicas e
corruptas.
É muito fácil mostrar e demonstrar, na escola, que
ao reclamar da falta de bom transporte público por meio da queima de ônibus, da
depredação de trens, do roubo de placas de sinalização o maior prejudicado é o
seu usuário.
Quando isso acontecer e resultar, hei de comer daquela fruta!
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