domingo, 12 de maio de 2019

DITOS DE MÃE


Ela já os trouxe prontos em 1929, da sua linda aldeia de Fonte Arcada, na Beira Alta, de cujos altos se via o Rio Távora, ainda livre, correndo sob a ponte romana que ali estava desde o século I da era cristã.
Maria do Céu Castro (depois Corrêa por casamento com António Lopes Corrêa) emigrara para o Brasil, fugindo da aldeia empobrecida que outrora conhecera tempos de prosperidade, quando pertencia a Inês de Castro – aquela que depois de morta foi rainha. Mas agora a realidade era outra e Fonte Arcada ficara pequena para as aspirações de Maria do Céu, as quais ela iria concretizar no seu Eldorado: o Brasil.
Seus ditos... Nasci e cresci a ouvi-los, a aprender com eles, a errar muitas vezes por não observá-los, a corrigir os rumos e voltar aos seus domínios, sempre sábios, incontornáveis.
E aqui estou, aos 82 anos, a recordá-los com muita saudade e gratidão:

Mais vale prevenir que remediar (um apelo ao planejamento e à cautela)
Tens mais olhos que barriga (quando ficava comida desperdiçada no prato)
Mais depressa se apanha um mentiroso que um coxo (válido para mentirosos de má memória)
Tantas vezes vai o cântaro à fonte que um dia... (contra esportes radicais e riscos evitáveis)
Cesteiro que faz um cesto, faz um cento ( quando a reincidência no erro é certa)
Quem tudo quer, tudo perde (contra ambição desmedida)
Cada qual sabe onde lhe aperta o sapato (o sofredor é que sabe de seu sofrimento)
Estás com as fraldas de fora! (advertência quando eu estava mal arrumado)
Estás  lanzudo! (aviso para eu ir cortar o cabelo)
Águas paradas não movem moinhos (nada de preguiça: só o trabalho traz prosperidade)
Pareces um cabrito montês! (comentário sobre a minha agilidade para correr, saltar, subir)
A pensar morreu um burro (quando eu estava distraído, com olhar distante)
Comer e coçar é só começar ( querendo que eu comesse mais – uma batalha perdida)
A pressa é inimiga da perfeição (quando eu errava algo fácil)
Criou fama, deita-te na cama (a reputação reconhecida é duradoura)
Amigos, amigos, negócios à parte (ela e suas compras e vendas...)
Muito riso, pouco siso (contra a jovialidade excessiva)
A cavalo dado não se olha o dente (ser bem agradecido sempre...)
Há males que vêm pra bem (derrotas ensinam a conquistar vitórias)
A palavras ocas, orelhas moucas (ignorar os maus conselhos)
O roto falando do esfarrapado (um pecador apontando o pecado alheio)
Deus ajuda quem cedo madruga (uma exortação ao trabalho duro)
Não há mal que sempre dure nem bem que nunca se acabe (esperança e temperança)
Tal pai tal filho (quando eu fazia algo igual a meu pai)

E assim fui vivendo e aprendendo. E sou feliz!
Obrigado minha mãe, Maria do Céu Castro Corrêa, neste Dia das Mães, véspera do Dia de Fátima.

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