quarta-feira, 4 de novembro de 2015

RESPEITO É BOM E... TODOS LUCRAM!

Uma característica cada vez mais evidente - e lastimável - das grandes cidades brasileiras é a generalizada falta de respeito às normas e leis vigentes,  aos bens e posturas públicas, aos direitos e propriedades do outro. Todos perdem com essa praga. No Rio a situação é crítica.
Não preciso ir longe para testemunhar essa lacuna de consciência cívica, de cidadania: basta sair de casa para a caminhada diária e sou confrontado  com essa falta de respeito onipresente.
Logo de cara encontro um carro estacionado irregularmente, cometendo duas infrações de trânsito (está do lado proibido da via e com duas rodas sobre a calçada), prejudicando a acessibilidade de cadeirantes e carrinhos de bebê e danificando a calçada, que não suporta o excesso de peso e vai sendo esburacada gradativamente. Infração que já dura meses! Impune! E quando a calçada tiver buracos, o proprietário do imóvel será intimado pela Prefeitura a fazer o conserto e pagar por ele. O poder fiscalizador permite que o carro infrator danifique o piso, pois não o multa, mas por outro lado obriga o infeliz proprietário a arcar com o prejuízo. E se você liga para o telefone 1746 da Prefeitura para reclamar de qualquer coisa, vai esperar muito para ser atendido, sua conta telefônica vai aos píncaros e normalmente a solução só está disponível em outra repartição - cujo telefone eventualmente está "pifado"... Abuso de poder e leniência com as infrações!

Prossigo ao longo da via de mão única e vejo um carro e duas motos trafegando em sentido contrário ao permitido e  avançando o sinal da esquina, Aproveitam  a deficiência de fiscalização e o tráfego ainda  incipiente da manhã. Acidentes graves já resultaram dessa infração repetida.
Chego ao Pomar da Barra e atravesso no semáforo fechado para os veículos, mas sempre com  cautela, pois a desobediência ao sinal é muito comum nesse lugar, ameaçando os frequentadores mais assíduos da pracinha: idosos, babás, mamães e suas crianças.
Cruzo o Pomar, cujo chão está cheio de frutos verdes, arrancados precocemente das mangueiras, pitangueiras e jambeiros, mas pelo menos fico feliz ao ver que há sabiás, pardais e sanhaços saltitando pelas árvores e crianças brincando alegres com suas bolas e bonecas.
Mais adiante, passam por mim, na calçada, bicicletas em alta velocidade, agora ameaçando os indefesos pedestres do bairro, mais uma vez cometendo uma infração que já se tornou comum. Tão corriqueira como a de jogar lixo dos mais variados tipos e tamanhos pelas nossas ruas, já maculadas pelas fezes dos cães de luxo da área. Infringindo elementares regras de convivência.
Nos dias de coleta de lixo já sabemos antecipadamente que a alvorada será pouco depois das 7 horas. Os funcionários da limpeza pública fazem suas tarefas aos gritos, talvez para que saibamos que eles trabalham ou porque acham que os demais mortais não têm direito a continuar dormindo já que eles estão acordados. Mais um desrespeito gratuito aos moradores.
Chego ao calçadão da praia, onde a situação não é melhor. Há uma ciclovia entre a rua e a calçada mas ainda assim muitas bicicletas insistem em trafegar entre os pedestres, às vezes seguidas por ameaçadoras motocicletas!
Mais adiante, outro perigo: uma jovem senhora caminha com um cão solto, o qual rosna ao aproximar-se de mim. Ela percebe e me tranquiliza, afirmando que o cachorro é manso. Realmente, é um "border collie", raça de trabalho de bom temperamento, mas dependendo das circunstâncias qualquer cão pode morder. Já tive mais de 50 cachorros ao longo da vida e sei que não seria impossível que eventualmente ele me confundisse com uma ovelhinha desgarrada... E é exatamente por essa característica canina que se exige do seu dono que o conduza na guia e de coleira. Infelizmente, o pior ainda vai acontecer a seguir: o "dócil pet" é levado para as areias da praia - local que lhe é proibido - onde suas fezes poderão contaminar muitos humanos com variadas pragas, mais ou menos graves.
Ao chegar ao quebra-mar da Joatinga, aprecio o panorama magnífico: toda praia da Barra, até o Recreio dos Bandeirantes, as ilhas e o oceano, salpicado de barcos que pescam lulas em profusão. Vislumbro, porém, a sujeira no piso e sobretudo sinto o cheiro forte de dejetos dos gatos que frequentam o local. Já não basta, nos momentos de maré baixa, a visão horrenda das águas pútridas que saem das lagoas, poluídas pelos esgotos irresponsáveis dos moradores de suas margens.
Na orla, bem em frente ao quebra-mar, um grupo  europeu construiu dois majestosos hotéis, confiando no potencial turístico do Rio e atendendo ao chamamento das Olimpíadas de 2016. Seus clientes, certamente, começam a explorar nossa cidade caminhando como eu pelo quebra-mar, mas lamentavelmente devem experimentar a mesma decepção com o abandono do local. A Prefeitura arrecada somas elevadas de ISS e IPTU daqueles empreendimentos, mas não lhes devolve em serviços a confiança que depositaram na Cidade. Um nítido desrespeito do poder público ao investidor, ao contribuinte e demonstração de gestão incompetente do espaço urbano.
Voltando da caminhada, encontro um vizinho com ar desesperado que saíra de sua casa para desanuviar as ideias, conturbadas por várias horas de tentativas frustradas para cadastrar sua empregada doméstica e emitir a respectiva guia de pagamento do SIMPLES (???). Uma mistura de incompetência, cinismo e abuso do poder cerca esse episódio lamentável, ilustrativo do desrespeito com o qual as autoridades de nosso país nos impõem uma verdadeira ditadura dos poderosos de ocasião contra os cidadãos comuns, pagadores de impostos escorchantes e mal aplicados ou mesmo desviados de sua destinação normal. Os atuais tecnólogos da informação da Receita Federal não sabem construir um site suficientemente robusto e seguro para uso pelos contribuintes e não querem confessar sua incompetência, ameaçando os contribuintes brasileiros com multas arbitrárias.
Está assim coroada, por esta pérola de abuso, a catadupa de desrespeito a que estamos sujeitos no Brasil atual.
Quando New York decidiu combater a brutal violência que assolava a cidade, adotou o conceito de "tolerância zero", coibindo as pequenas infrações, pois é partir delas que os delinquentes iniciam sua escalada de crimes, que culminam com homicídios, sequestros e latrocínios. Teve sucesso!
Como seria bom se nossas autoridades seguissem esse exemplo!

2 comentários:

  1. Diz a sabedoria popular que "exemplos vêm de cima". A Presidente da República Federativa do Brasil chegou 20 minutos atrasada para receber (?) membros da Família Real do Japão, em visita oficial de cortesia ao nosso país esta semana. Não é de estranhar que nosso povo use e abuse do desrespeito a tudo e a todos.

    ResponderExcluir
  2. Em tempo: estive no Japão (Conferência Internacional de Educação de Adultos, Tóquio, 1972) e pude constatar que o povo daquele país é de uma polidez extrema. Educadíssimos. Lastimável!

    ResponderExcluir

VIAGEM AO PASSADO

O Irã está na moda e minhas recordações daquele país mais vivas do que nunca... Estive no Irã em 1976, para participar da Conferência In...