O professor talentoso,
bem formado e motivado, é um fator de primordial importância para a educação de
qualidade. Mas os jovens brasileiros talentosos não se imaginam dando aula numa
escola pública de ensino básico.
Para cada país, em
determinado momento, existem profissões com maiores ou menores atrativos. Há,
inclusive, aquelas que sofrem rejeição, como é o caso da carreira de professor de
educação básica no Brasil atual. Os especialistas invocam as chamadas forças de
atração e de repulsão, que explicariam a cotação que os candidatos a emprego
atribuem às diferentes opções que lhes são oferecidas pelo mercado. Mas não há
uma lógica irrefutável. O problema é complexo e envolve muitas variáveis, tanto
objetivas quanto intangíveis: remuneração, prestígio social, estabilidade no
emprego, condições de trabalho, vocação, busca de notoriedade, tradição
familiar... Enfim, um emaranhado causal indecifrável. Mas uma coisa é certa: a
carreira de professor de educação básica não tem grande atratividade no Brasil,
especialmente para o exercício profissional nas escolas públicas, embora também
apresente muitos aspectos positivos. As estatísticas causam alarme e registram
que as Licenciaturas, relativamente, têm cada vez menos candidatos que as demais
carreiras tradicionais e que os futuros docentes têm resultados acadêmicos
progressivamente mais fracos a cada ano. Seria esse um motivo para desistir de recrutar
um professorado constituído de pessoas talentosas? Certamente que não! Afinal, os
incontáveis cursos de teatro, dança, música, bailado etc mantidos pelas ONGs
nas comunidades carentes do Brasil vivem repletos, assim como os seus similares
frequentados pelas classes médias, mas todos sabem das agruras e incertezas das
respectivas profissões. Afora umas poucas centenas de artistas que fazem
sucesso e fortuna, a imensa maioria desses trabalhadores vive penando nas
piores condições, em busca de um lugar ao sol. Qual será o mistério dessa
atratividade pelas luzes da ribalta que a sala de aula não tem?
- A
EDUCAÇÂO DEVE TER SEU PROGRAMA DE TV!
A televisão é
tão potente e influente no Brasil que há quem lhe atribua a capacidade de mudar
paradigmas, criar ídolos e vilões, vender o invendável. “Não deu na TV ? Não aconteceu !” (Walter Clark, Diretor
de Rede de TV). Uma hipótese razoável, portanto, é que quando os artistas
aparecem na mídia, estão ali para se exibir e brilhar, ganhar notoriedade e
aquele sempre bem-vindo prestígio social inerente às ocupações da área
cultural. As situações de insucesso, penúria, vícios, infelicidade, embora
frequentes, só raramente são focalizadas. Em contrapartida, a atividade do
professor de educação básica tem sido mostrada pela mídia exatamente nas condições
mais desfavoráveis: ao sofrer algum tipo de violência; reivindicando melhoria
salarial em
greves intermináveis; quando sua escola deixa de funcionar porque houve
tiroteio nas vizinhanças ou o teto da sala de aula caiu, por conta das infiltrações
etc. A TV aberta está presente em praticamente todos os lares brasileiros e a
influência que exerce é tão fantástica que a carreira do magistério do ensino
fundamental e médio poderia ter um “ponto de inflexão” se recebesse sua ajuda
deliberada e competentemente orientada. Uma sugestão seria produzir e veicular
semanalmente, em cadeia nacional de emissora aberta, de grande audiência, um Programa de TV
sobre a educação, em sua realidade integral e não apenas pelo seu lado
desfavorável. Agradável ao gosto popular, comandado por um comunicador
consagrado, o Programa visará “virar o jogo” e conciliar uma audiência
apreciável, atingindo o grande público, com o empenho em apresentar o professor
e seu trabalho como temas centrais. Objetivará elevar o prestígio social e
autoestima do professorado da educação básica, para reter/atrair talentos,
notadamente para atuar no ensino público. Existem mais de 2 milhões de docentes
em atividade em todos os níveis, espalhados pelo
vasto território do Brasil, que o Programa atingirá diretamente. Mas, potencialmente, todos os
públicos serão tocados, de modo a mudar a percepção geral que se tem da
profissão.
- PROGRAMAÇÃO
Em princípio, a
programação seguiria os modelos com grande audiência já existentes, que podem
ser denominados de segmentados ou“setoriais” – caso dos programas rurais – e que
tanto sucesso tiveram no Brasil, a ponto de se multiplicarem e tornarem
onipresentes. Obviamente, a programação dedicada à educação básica terá aspectos diferenciais,
de modo a atingir seus objetivos específicos. Após uma análise dos resultados
das pesquisas existentes sobre as aspirações do professorado brasileiro, a
equipe de produção do Programa definirá conteúdos e formatos iniciais. Ao longo
da veiculação do Programa - e até utilizando-o como instrumento de coleta de
informações - será possivel focar nos temas mais sensíveis ao professorado do
ensino público e aos estudantes candidatos às Licenciaturas, já agora com
sintonia fina, imprimindo à produção uma dinâmica objetiva, de base científica.
No Programa idealizado, haverá um mosaico de formatos distintos: notíciário,
entrevistas, reportagens, dramaturgia, documentários, seções fixas de
perguntas/concursos e de interação com o público. Mas a constante será manter o
professor como sua figura central, respeitada, reverenciada, amada, humana,
benemérita, importante para o futuro do país, mostrando seu trabalho e seus exemplos
positivos. O Programa exibirá ao público, sempre que possível, o professor real,
que está atuando em sala de aula - e não um personagem, um ator. As matérias com o mestre de carne e osso serão filmadas
“in loco”, trabalhando em sua escola ou
na comunidade, de modo que tenha “os seus quinze minutos de glória”, um dos
ingredientes básicos do projeto. Essa notoriedade, ainda que fugaz, exerce uma
grande atração sobre nosso povo e o professor brasileiro do ensino básico – que
não é diferente – precisa e quer aparecer, ganhar em autoestima, recuperar seu
prestígio social. Visto como um elemento importante para a comunidade e protagonista
do desenvolvimento nacional.
Independentemente
de pesquisa, alguns conteúdos e formatos devem ser quase que obrigatórios no
Programa:
a)Embora a
educação brasileira seja de qualidade sofrível para ruim (vide colocações
obtidas pelos estudantes brasileiros nos testes PISA da OCDE), há muitos trabalhos
excelentes sendo feitos pelos nossos docentes, nos vários níveis de ensino. Utilizando
o formato “reportagem”, deve-se focar nesses exemplos com o maior detalhe possível,
pois que veiculados servirão para aperfeiçoamento dos demais professores, originando
séries pedagógicas de educação a distância e transmissão de práticas que oxigenarão
o sistema;
b)A gestão de
qualidade merece seu espaço midiático. Os trabalhos meritórios dos diretores
das escolas básicas e das autoridades educacionais devem ser ressaltados nas
reportagens, pois uma liderança dinâmica pode transformar comandados, revelar
elementos úteis e laboriosos – cujo talento dormitava no marasmo de um sistema burocrático;
c)O noticiário atualizado
sobre assuntos de interesse coletivo, como a legislação educacional (sem o
“bias” da “chapa branca”), problemas e soluções do cotidiano escolar, os fatos
curiosos vividos pelos professores em seu trabalho etc deve constar da grade
programática, sempre apresentando o docente de forma positiva;
d)Ações de
heroismo e dedicação extrema dos docentes brasileiros devem ser apresentados frequentemente
e para isso a dramaturgia – ponto alto da nossa TV, internacionalmente reconhecido
- jogará papel de relevo. Mostrando, por exemplo, como a ação de um professor pode mudar a vida
de pessoas ou comunidades inteiras. Na história do rádio brasileiro registra-se
que em meados do século passado, a Rádio Nacional veiculava um programa de
grande audiência que levou muitos jovens a optar pela carreira médica. O título
era “Obrigado Doutor” e seu apresentador - famoso - era o obstetra Paulo Roberto. Contava
histórias fantásticas de vidas salvas pelo conhecimento científico, dedicação,
intuição ou amor à profissão de médicos reais ou fictícios, geralmente
clinicando no interior, sem dispor de maiores recursos. Um sucesso que comovia
multidões!
e)O Programa
deve ter também um concurso de perguntas e respostas só para docentes do ensino
médio e fundamental, com ótimas premiações, crescentes à medida que o candidato vá vencendo etapas, acertando todos
quesitos, estabelecendo-se um limite superior de premiação bem elevado. Também
no século passado, um programa de TV desse tipo fazia sucesso estrondoso: denominado
“O Céu é o Limite”, seu comunicador era J. Silvestre. Os professores precisam
ter a sensação de que, caso se esforcem, podem ficar famosos, ganhar milhões e
que sua carreira não é “um beco sem saída”, rotineira e desprestigiada. E o brasileiro deve conscientizar-se de que o saber
do mestre tem valor inestimável;
f)No sentido de
manter os docentes atualizados, o Programa deve divulgar pesquisas sobre
educação realizadas no Brasil e no exterior, principalmente quando seus resultados
acarretarem inovações/reorientações no
ensino. No formato de documentário ou noticiário, a seção deve dar prêmios de
viagens para professores conhecerem as inovações
de sucesso;
g)As premiações
de docentes devem ser uma constante do Programa. Proporcionar-lhes estágios em
Universidades estrangeiras ou bolsas para Mestrado e Doutorado no Brasil, sempre
em valores atraentes. O Programa deve contribuir para que desfrutem de
oportunidades de uma educação continuada de qualidade. Os prêmios serão atribuídos a docentes que realizem
trabalhos pedagógicos notáveis, selecionados dentre as reportagens realizadas ou
em concursos específicos promovidos pelo Programa;
h)O Programa
deve manter um “site” na web, buscando a interação permanente com os
telespectadores, por meios diversos, recolhendo sugestões, reclamações,
opiniões, enfim recebendo o “feedback” sempre útil para o aperfeiçoamento do
Programa.
i)A preocupação
com a criação de conceitos novos, faltantes na educação brasileira, pode ser outra
grande contribuição do Programa. A discussão de temas abordando “a escola como
centro da comunidade”, “o controle de qualidade do processo educacional pela
sua clientela e não por órgãos públicos
e burocráticos”, “a implantação da figura do professor de família, elemento
democratizante para atuação junto às famílias pobres e miseráveis” etc etc
podem dar origem a debates interessantes, para arejar o setor educacional e
consequentemente gerar um ambiente mais propício aos profissionais talentosos.
O Programa, em
rede nacional, atingirá o público telespectador em geral, conscientizando-o
sobre a importância da educação e evidentemente devendo agradá-lo como
espetáculo e entretenimento, de modo a maximizar a audiência. Mas para a equipe
de produção do Programa, o público-alvo subjacente será o professorado
brasileiro em todos os níveis, que se
quer valorizar, assim como jovens na fase de escolha da profissão, que
se quer atrair.
As premiações em
dinheiro, oferecidas pelo Programa, servirão de estímulo aos professores qualificados
que ali verão sua chance real de desfrutar de uma boa qualidade de vida Os prêmios em viagens de estudo atrairão
pessoas talentosas, que almejam a oportunidade de crescer intelectualmente,
aproveitar plenamente seu potencial. Não haverá dificuldades em produzir um
programa do agrado do grande público, pois o Brasil faz uma televisão
reconhecida mundialmente como de ótimo nível. Desse modo, o Programa poderá, efetivamente, mudar a atual percepção sobre o exercício do
magistério no Brasil, mostrando as boas práticas pedagógicas, o dinamismo dos melhores exemplos de direção das
escolas e a inovação nascida das pesquisas divulgadas. O Programa será
financiado por meio do patrocínio, integral ou em cotas, de empresas de âmbito
nacional, dentro de seus programas usuais de publicidade e marketing. Mas pode também
concorrer, pela sua natureza, aos incentivos fiscais da área cultural (Lei
Rouanet). Os indicadores de êxito serão audiência em alta, visitas maciças ao
“site”, correspondência volumosa, envio espontâneo de matéria pelos professores
e seus diretores.
São produtos esperados do
projeto: a) a difusão de pesquisas educacionais, de inovações pedagógicas e de
boas práticas de ensino; b) a educação continuada e consequente aperfeiçoamento
dos docentes que assistem ao Programa; c) a produção de material bruto para
séries de treinamento de professores; d) estímulo à meritocracia pela premiação
dos mestres mais destacados; e) o aumento do prestígio social do professorado; f)
a atração de talentos para a carreira; g) a criação de um amplo espaço
participativo e de interação com o público para os docentes brasileiros; h) o
debate dos grandes problemas da educação nacional e a introdução, nessa
discussão, de conceitos inovadores e renovadores do setor.
- CONCLUSÃO
Talvez não seja
possível medir o imenso retorno financeiro que, nos últimos trinta anos, os
programas rurais de televisão deram à produção da agropecuária e à renda do
homem do campo no Brasil. Caso um exercício econométrico nesse sentido fosse
possível e efetivamente realizado, seu resultado certamente aconselharia a
implementação do Programa de TV sobre Educação aqui proposto. "Quem
não se comunica se trumbica" (Abelardo Chacrinha Barbosa, animador de
TV).
Que grande projeto! Lamentável que não haja interesse por algo deste calibre no Brasil.
ResponderExcluirJr
Caro Junior: quem sabe um dia... Grato pelo seu incentivo, Arlindo
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