- O
CONTEXTO
O país necessita
de instrumentos de política para atrair os jovens talentosos para o
professorado das escolas públicas de nível
médio, ainda em expansão, pois os efeitos nocivos dos respectivos deficits
vão agravar-se a curto prazo. Em 2011 o ensino médio brasileiro tinha 8,4
milhões de alunos e ocupava cerca de 500 mil professores. Sua expansão é relativamente
recente e continua em andamento (o ensino obrigatório dos 4 aos 17 anos só foi inserido na
Constituição em 2009), sem que se tenha feito a respectiva formação dos
quadros docentes, com bons padrões de qualidade. Pior: a relação
candidatos/vagas nas Licenciaturas deteriora-se em termos qualitativos
(candidatos são cada vez menos habilitados). Agravando o deficit, há uma demanda
concorrente de professores para as novas unidades federais de ensino técnico,
construídas nos últimos anos: em 2002 existiam 140 dessas escolas; em 2012 já são
354 e em 2014 serão 562. Emergencialmente, essas instalações estão
sendo utilizadas pelo PRONATEC, um programa que visa atender a milhões de
jovens para sanar o “apagão de mão de obra qualificada” que está prejudicando
muito a economia do país, baixando sua produtividade e a competividade de
nossos produtos e serviços.
- CONSEQUÊNCIAS
NEGATIVAS
O controvertido
“sistema de cotas” é sintoma eloquente de
que o ensino público de nível médio é um obstáculo à democratização de
oportunidades no Brasil. Frequentado pelos jovens pobres e dos estratos de
menor renda da classe média, seus diplomados têm dificuldades no acesso ao curso superior de
melhor qualidade e na transição para o mercado de trabalho. A “hora da verdade”
para formados nos cursos médios das escolas públicas pode chegar nos maus
resultados em exames vestibulares, em provas do ENEM e na dificuldade de classificação
para o SISU e o PROUNI. Agora mesmo há sobra de bolsas de estudo no exterior
dentro do programa Ciência sem Fronteiras pelo fato de os estudantes brasileiros
não dominarem uma segunda língua. A má qualidade do ensino público pode também evidenciar-se
quando da busca do primeiro emprego formal, dificultada pelo desprestígio da
formação recebida, deficiente e cheia de lacunas, já bem conhecida das
empresas. Em muitos casos, por não dominar certos conhecimentos básicos, esses
jovens fracassam até mesmo ao frequentar os cursos de qualificação profissional
necessários à colocação em postos de
trabalho exigentes em competências e habilidades específicas. Nessas situações,
os estudantes estão pagando o preço dos desfalques nos quadros docentes, repetidos
a cada ano letivo, em muitas escolas das várias Unidades da Federação; sendo
penalizados pelo absenteísmo/grevismo exagerados de seus mestres desmotivados, uma
constante; e lamentam as poucas aulas ministradas em matérias essenciais – como
Matemática, Física e Química – nas quais o déficit de professores é mais agudo. Esta proposta,
por tudo isso, prioriza a atração/retenção de docentes para o ensino médio
público.
- FORÇAS
DE ATRAÇÃO E REPULSÃO
A conquista de
talentos para o exercício do magistério em nossa educação básica pública encontra
uma barreira inicial na situação em que a maioria dos professores exerce
atualmente essa profissão. Fato muito divulgado pela mídia, mostrando escolas localizadas
em zonas de risco, em condições físicas deploráveis, sem equipamentos
essenciais; ou realçando o fato de que a violência das periferias e favelas e a
penetração das drogas entre os jovens já adentraram as salas de aula. Culminando com a omissão de certas
autoridades, cuja gestão displicente e burocrática falha no apoio aos
funcionários e docentes trabalhando nessas condições de risco. Testemunhos
eloquentes de que dificilmente se poderia caracterizar o magistério público como uma
carreira estimulante, recompensadora, capaz de exercer fascínio sobre as novas
gerações, sobretudo atraindo seus elementos mais capazes. Ao contrário, a
realidade atual é importante fator de repulsão à profissão. A valorização do corpo
docente em atividade é, por isso mesmo, condição “sine qua non” para captar
talentos para a carreira, em face de seu “efeito demonstração”. Além do que há risco de perder muitos dos docentes em atividade -
provavelmente alguns dos mais qualificados - propensos a migrar para ocupações melhores,
em setores mais promissores. Neste vasto país continental, nos sistemas
públicos de ensino médio, de qualidade sofrível, há porém trabalhos valiosos em andamento. Exemplos
de boas práticas que devem ser divulgados, visando sua universalização.
- A
FORÇA DO MARKETING E CRITÉRIOS MERITOCRÁTICOS
A situação
desfavorável do professorado em atividade não é, todavia, um obstáculo
intransponível para recrutar novos e bons valores para a carreira. Certas
analogias desmentem esse determinismo. A profissão que maior atração exerce
sobre a nova geração do sexo masculino no Brasil é a de jogador de futebol. Não
havendo problemas de recrutamento para esse esporte, a vasta demografia
brasileira resulta em oferta abundante de talentos. E como o sistema de seleção funciona
obedecendo aos critérios de mérito, nossos jogadores fazem sucesso global e
ocupam espaços abundantes na mídia mundial. Fechando o “círculo virtuoso”, há cada
vez mais brasileirinhos que almejam e tentam o estrelato futebolístico. No
entanto, quando se vai pesquisar a situação real dos jogadores atuando no
Brasil, verifica-se que além de a carreira ser curta, a esmagadora maioria
trabalha em condições precárias, mora em alojamentos desconfortáveis, recebe
remunerações modestas – abaixo da média salarial do trabalhador brasileiro,
pesquisada nas seis maiores regiões metropolitanas pelo IBGE (na Pesquisa
Mensal de Emprego). A grande atratividade dessa profissão deve-se ao sucesso de
algumas poucas centenas de jogadores de ponta que ganham somas milionárias,
levam uma vida social charmosa, têm acesso ao “grand monde” e muita exposição
nas mídias. O apelo da carreira futebolística resulta de os jovens pretendentes
acreditarem na sua própria capacidade para “chegar lá” e na prevalência do
mérito, como fator de julgamento para definir quem vai fazer sucesso. Na
prática do jogo, predomina a meritocracia: os atletas estão sempre expostos aos
olhos dos técnicos e ao julgamento das multidões. O marketing das estrelas e a prevalência
do mérito atraem os jovens talentosos. Já existem algumas iniciativas no ensino
público – muito tímidas e suscitando forte reação contrária - no sentido da implantação
de sistemas de remuneração diferenciada segundo o mérito. O fato de a educação
presencial ainda ter as características econômicas de um artesanato, em que a
produtividade média da mão de obra é baixa, torna inviável pagar altos salários
às centenas de milhares de professores em atividade. Assim, a gradação salarial
fundamentada na produtividade talvez fosse uma das boas soluções para atrair
talentos para a docência. Infelizmente, trata-se de um sonho irrealizável no momento
brasileiro atual. De um lado, pela própria dificuldade de realizar comparações de
mérito nos serviços públicos, desorganizados e incapazes de supervisionar suas
unidades. De outro, em função da
ideologia dominante nas esferas de poder brasileiras – uma mentalidade que repele
a evidenciação das diferenças individuais e não admite nem discutir soluções meritocráticas.
Finalmente, a resistência dos próprios professores e seus sindicatos de se deixarem
avaliar.
- A
SOLUÇÃO
É preciso
contornar – ainda que parcialmente – as barreiras à prevalência do mérito.
Buscar caminhos para premiar generosamente os professores talentosos,
transformá-los em “celebridades”, criar o “efeito demonstração” que torne a
carreira atraente e charmosa. A proposta para reter os milhares de docentes em
atividade – e de quebra motivar jovens candidatos ao magistério - seria conceber
e executar uma programação de CONCURSOS variados de BOAS PRÁTICAS DE ENSINO, com grande publicidade e ótimos
prêmios, abertos aos professores do ensino médio público. Cada Concurso teria:
a) divulgação ampla na grande mídia, cobrindo sua abertura, premiação e
resultados finais, de modo a tornar conhecidos e admirados os professores vencedores
– transformando-os em personalidades midiáticas; b) recompensa pecuniária elevada
para os docentes vitoriosos, que realizem trabalhos notáveis, de modo a generalizar a crença de que a carreira
permite acumular um bom patrimônio e que seu mérito é reconhecido pela
sociedade; c) divulgação detalhada, pelos meios adequados, do conteúdo dos
trabalhos premiados, de modo a servirem como motivação, inspiração e
treinamento prático para os demais docentes em atividade. Os participantes dos Concursos seriam
os atuais professores do ensino médio público, que poderiam apresentar
trabalhos individuais ou em grupo (estimulando a multidisciplinaridade), mas o
programa também influenciaria os jovens talentosos que estão no período de
escolha da profissão. O ensino médio brasileiro é urbano (97%), mas os Concursos, seus vencedores e os
projetos premiados, dependendo dos recursos midiáticos utilizados na divulgação,
serão conhecidos em todo território nacional, influenciando docentes de todos
os níveis. O prestígio social em alta, a notoriedade granjeada pelos ganhadores –
“celebridades do conhecimento” – e o dinheiro auferido na disputa, são as motivações para atrair e reter mestres
talentosos em geral, dando-lhes a esperança de que seu trabalho terá o justo
reconhecimento. A percepção acerca da
carreira no ensino público se fará sob um novo olhar, identificando dinamismo,
espírito de iniciativa e de inovação onde antes só parecia haver imobilismo e
burocracia. O projeto tem a vantagem de que um pequeno grupo pode coordenar sua
implementação. Especialista em Concursos se encarregará de sua concepção e execução,
com um ou dois educadores para assessorá-lo. Haverá um sítio próprio e
exclusivo dos Concursos na internet, com a respectiva equipe terceirizada, o
que facilitará o envio do material pelos concorrentes – o qual poderá atingir
quantidades ponderáveis e adquirir formatos diversos: vídeo com som; vídeo
ilustrando texto; “power point show” ou similar; texto com ilustrações etc etc.
Um grupo de jurados de notório saber, escolhido a cada Concurso, será
responsável pela seleção inicial dos concorrentes. Na maioria dos casos, os
vencedores dessa primeira “peneira” serão submetidos a uma segunda etapa de
validação e julgamento, realizada “in
loco” (na comunidade, escola etc) e bem documentada, precedendo a decisão
final. Havendo televisionamento e sucesso dos Concursos, pode-se ter votação
popular em cada julgamento final, por meio do sítio na web ou através de
telefonemas - neste caso a receita revertendo para os vencedores e/ou a produção
do programa. O ideal seria utilizar o programa de TV de algum comunicador com
grande audiência para lançamento, julgamento final e divulgação dos resultados.
E sobretudo para celebrizar os vencedores. Há viabilidade de conseguir cotas de patrocínio de empresas de âmbito
nacional, pelo próprio valor publicitário da promoção ou dentro de seus programas
de responsabilidade social. O Concurso pode levar o nome do patrocinador
principal ou de marca de sua escolha. É possível
começar o programa quase de imediato, devendo o Concurso preceder o início dos
semestres letivos. Cada um deles estender-se-á por um ou dois semestres, mas a
série será duradoura, na medida do êxito e sempre que novos temas de competição sejam idealizados. O
resultado esperado é a retenção dos bons docentes em atividade, o crescimento
do prestígio social da carreira e a maior adesão futura de talentos à profissão.
O lançamento do Concurso em si melhorará a qualidade do ensino médio público de
imediato, pois os docentes em atividade se esforçarão por desenvolver trabalhos
pedagógicos relevantes, visando a própria participação no certame. Podem ter todo esse
impacto esperado, por exemplo, os Concursos para professores versando sobre: a)
criação de jogos educativos (eletrônicos ou não) de caráter pedagógico; b) desenvolvimento
e execução de atividades criativas de
envolvimento dos alunos com a comunidade; c) projetos de ciência e tecnologia
desenvolvidos em suas classes; d) concepção de programas de computador visando
a educação a distância; e) idealização e
aplicação de projetos de atividades pedagógicas em parceria com empresas; f) criação e aplicação, com seus alunos, de
projetos de economia solidária em comunidades carentes; g) idealização e
execução, em benefício de seus alunos, de
projetos de empreendedorismo e colocação no emprego; h) elaboração, individualmente
ou em grupo, de material didático para tópico(s) relevante(s) de determinada matéria
ou temas interdisciplinares. Será também possível lançar Concurso(s) idealizado(s)
de forma dirigida para professores desta ou daquela disciplina, cujos efetivos são
mais deficitários ou no caso de falta de candidatos talentosos à respectiva Licenciatura. Ao longo do tempo, os temas podem ter complexidade
crescente, por exemplo Concursos sobre trabalhos de criação de tecnologias
sustentáveis realizados pelos docentes com seus alunos ou então a concepção, formulação e implementação de projetos
que tornem o resultado de determinada política pública mais eficaz para a
comunidade em que se insere a escola etc etc. Cada um desses Concursos dará
origem a rico material didático multimídia, utilizável para treinamento presencial
ou a distância de professores, atuais e futuros, do ensino médio. Após alguns
Concursos e uma pós-produção adequada do material, ter-se-á uma coletânea dos projetos vencedores que se
constituirá em excelente e abrangente curso de aperfeiçoamento de docentes em
práticas pedagógicas. E montar-se-á, automaticamente, uma equipe de “craques”
do magistério: serão os próprios vencedores e melhores colocados dos diversos certames,
provavelmente residindo em vários locais diferentes, que poderão funcionar como
rede capilar para realizar diversas tarefas importantes: atuar como propagandistas,
instrutores e multiplicadores dessas coleções didáticas, dar treinamentos,
palestras, participar de Seminários Operacionais. O material didático de
qualidade, assim produzido, é passível de concorrer a financiamento dos
programas de material didático do MEC. Há uma gama ampla de possibilidades
dentro da lógica deste projeto, extensível a outros níveis de ensino e até para
atingir mais diretamente os jovens talentosos que estão na fase de escolher a
profissão. Com a continuidade, esta série de Concursos será um poderoso
instrumento de política educacional. Independente, democrático, fundamentado no
mérito.
Caro amigo,
ResponderExcluir"Uma voz que clama no deserto..."!
Estou deslumbrado com tamanho conhecimento de causa desvendado com tanta simplicidade e soluções perfeitamente aplicáveis. Peço a Deus que ilumine nossos agentes educacionais. Enquanto isto, continue a nos ilustrar com sua cultura e discernimento. Obrigado.
Caro Roberto: é bom ter um amigo para fazer comentários que estimulam a prosseguir. Quem sabe um dia aproveitam algo que escrevi...Abraços, Arlindo
ExcluirCaro Junior: agradeço seu incentivo ao meu blog. Deserto ou oásis, tentarei sempre...Abraços, Arlindo
ExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirO Programa Fantástico, da TV GLOBO, iniciou em 16/03/2014, domingo, uma série de excelentes reportagens sobre escolas que propiciam um ensino de qualidade a seus alunos. O primeiro exemplo apresentado foi a Escola de Nível Médio de COCAL DOS ALVES, município do norte do Piauí, uma das regiões mais pobres do Brasil. A qualidade resulta da gestão competente e motivadora, do ambiente físico e psicológico adequado da escola e de suas conexões com a comunidade - que ela, a educação de qualidade, vai transformar a longo prazo em um polo de desenvolvimento. Com os primeiros resultados positivos dos seus alunos, no ENEM e nas Maratonas de Matemática, a escola deslanchou definitivamente e é um orgulho dos habitantes de Cocal dos Alves. Parabéns ao FANTÁSTICO, pois essas reportagens sobre escolas de sucesso farão, pela qualidade da educação brasileira, mais do que todos os ineficazes programas federais com o mesmo objetivo, em execução neste momento .
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